segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Não Sou Feito de Aço

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Eu gostava de alimentar a fantasia de que nada era capaz de me atingir. Que, a despeito dos acontecimentos, minha frieza era tanta que poderia ignorar o que quer que fosse. No começo, era claro uma fantasia, que tomou força e fôlego ao longo dos anos e se solidificou em minha personalidade. Por quê? Porque me parecia que ser uma pessoa aberta aos sentimentos, ser uma pessoa vulnerável ao que acontece ao redor era mais uma fraqueza do que uma virtude.

Com o passar do tempo, as coisas que me tocavam já não despertavam mais o menor interesse, quando não instigavam um certo desprezo. Me tornei cínico, sarcástico, seco, arrogante. Tudo para sustentar aquela idéia falível de que valia a pena ser frio como gelo. Na minha cabeça, eu seria capaz de passar por cima de quem quer que fosse, de que seria capaz de perder pessoas sem sentir sua falta, que não precisaria enxergar beleza em certas coisas. Mais e mais, minha mente foi mudando, passando da sensibilidade quase artística para uma racionalidade rígida.

Eu mudei. Tinha conseguido mudar quase totalmente, suprimir aquele Eu fraco que existia. Mas ninguém que tenha nascido como eu pode sustentar uma máscara tão pesada por tanto tempo. Comecei a enlouquecer sem perceber, e quando percebi já era tarde. Na tentativa de ser forte apenas me destruía mais um pouco deixado apenas com uma sombra do que era antes. Mas estava convencido de que era aquela a solução para mim. Ser frio, racional, implacável. E insisti na loucura, convencido de que nada poderia me atingir, mesmo cravejado do flechas no peito.

Mas recentemente, descobri que tudo isso não passa de uma ilusão infantil. Cometi erros que achei que, como um ser frio e insensível, estaria preparado para cometer, e, na verdade, quando o horror me atingiu, me senti desesperado e sem ter para onde fugir. Perdi pessoas ao longo do caminho e chorei como criança, perdido, sem saber como aquilo foi acontecer.

A verdade é que não sou feito de aço.

sábado, 29 de janeiro de 2011

A Voz de Um Povo

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O país das múmias vive um dos mais longos reinados da história contemporânea. Talvez inspirado por algum dos Ramsés, ou qualquer outro faraó, o presidente Mubarak insiste em reinar soberanamente sobre o Egito. No entanto, seu governo de mais de 30 anos parece estar preste a acabar.

O desejo do povo egipcio por democracia levantou uma onda de prostestos que nem mesmo a polícia foi capaz de conter, ordens foram ignoradas e a ameaça é tão grande que o presidente foi obrigado a tomar um atitude e mandar seus ministros pra casa. Claro que a decisão é pífia, considerando o desejo da população egípcia: o fim do governo Mubarak.

O impressionante em todo esse episódio é a capacidade de um povo estremecer os alicerces de um governo. Ver que um povo oprimido por um governo “monárquico”, rígido, intransitório e deficiente é capaz de se organizar, se juntar, unir e fazer a história mudar. Que fique a lição para aqueles que se sentem injustiçados por seus governos. Reclamar não muda nada. Lutar muda tudo.

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

O Nome de Uma Tragédia




A bonança chegou, literalmente, para as milhares, senão milhões de pessoa que vivem (ou viviam) na região serrana do Rio de Janeiro. Centenas de mortos, milhares de desabrigados. A bonança chegou mas o pior ainda parece estar por vir. Reconstruir uma vida inteira que foi levada pelas águas é extremamente difícil.

O desespero ofuscante faz as pessoas desviarem as atenções daquilo que mais importa nesse momento. Reconstruir a vida é certamente necessário, mas descobrir os responsáveis pela tragédia é tão imprescindível quanto. Por quê? Por que, caso os mais desavisados ainda não tenham percebido, todo mês de Janeiro a história se repete. Seja na região serrana do Rio, na área metropolitana de São Paulo, seja no Norte, Nordeste, Sul... Janeiro chega e os noticiários são tomados por notícias sobre chuvas, tempestades, inundações, deslizamentos de terra. O motivo por trás dessas tragédias? Negligência.

Governos negligentes que não fiscalizam e controlam o crescimento urbano de suas cidades, que deixam as pessoas construirem onde elas quiserem - "quiserem" não é o termo exato, afinal, se fosse uma questão de escolha ninguém moraria no morro. Mas é mais fácil deixar que a população construa casas em áreas de risco do que perder votos por desapropriações e desocupações, mesmo que seja para a segurança das próprias pessoas. É mais fácil deixar que construam em áreas de risco do que investir SERIAMENTE em programas habitacionais para evitar o crescimento desordenado que leva a tragédias como a da semana passada. É mais fácil deixar que as casas e ruas ocupem lugar de rios e que o asfalto cura a terra, porque, afinal, onde o povo vai morar?

E, agora, onde o povo vai morar?

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Águas de Março - Tom Jobim

É o projeto da casa, é o corpo na cama
É o carro enguiçado, é a lama, é a lama
[...]
São as águas de Março fechando verão